segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Maus: a história de um sobrevivente, de Art Spiegelman

Sinopse:

Maus ("rato", em alemão) é a história de Vladek Spiegelman, judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz, narrada por ele próprio ao filho Art. O livro foi publicado em duas partes, a primeira em 1986 e a segunda em 1991. No ano seguinte, Maus ganhou o prestigioso Prêmio Pulitzer de literatura. A obra é um sucesso estrondoso de público e de crítica. Desde que foi lançada, tem sido objeto de estudos e análises de especialistas de diversas áreas: história, literatura, artes e psicologia. Em nova tradução, o livro é agora relançado com as duas partes reunidas num só volume.

Nas tiras, os judeus são desenhados como ratos e os nazistas ganham feições de gatos; poloneses não-judeus são porcos e americanos, cachorros. Esse recurso, aliado à ausência de cor dos quadrinhos, reflete o espírito do livro: trata-se de um relato incisivo e perturbador, que evidencia a brutalidade da catástrofe do Holocausto. Spiegelman, porém, evita o sentimentalismo e interrompe algumas vezes a narrativa para dar espaço às dúvidas e inquietações. É implacável com o protagonista, seu próprio pai, retratado como valoroso e destemido, mas também como sovina, racista e mesquinho. De vários pontos de vista, uma obra sem equivalente no universo dos quadrinhos e um relato histórico de valor inestimável.


Já mencionei aqui no blog o quanto eu considero interessantes as histórias sobre a Segunda Guerra Mundial (desde os seus antecedentes até suas ramificações). Quando tomei conhecimento de Maus: a história de um sobrevivente, senti que iria gostar muito da obra. Felizmente, acertei.

Este texto não pretende ser uma resenha, afinal, o livro é tão fantástico que nada do que eu diga aqui será suficiente. Portanto, contento-me em apenas comentar, sem pretensões, sobre o livro que, com certeza, será o destaque das minhas leituras de janeiro.

Conforme a sinopse já adianta, o livro conta a história de Vladek Spiegelman, judeu polonês que sobreviveu a Auschwitz, o campo de concentração mais famoso de todos os tempos. Ele narra toda a sua trajetória ao seu filho (e autor da obra) Art, meio a contragosto, pois em determinado momento ele afirma que fez questão de 'esquecer' tudo o que havia acontecido naqueles dias tão terríveis e que só estava relembrando os fatos por causa das perguntas de seu filho. Confesso que achei Art muito insensível; tive a sensação de que ele via na figura de seu pai apenas uma fonte de informação para o seu trabalho, esquecendo-se, muitas vezes, de como tudo aquilo era doloroso para ele e de como sua saúde estava debilitada. Cabe mencionar, entretanto, que demonstrar ao leitor essa "insensibilidade" foi muito "nobre", ou seja, ele foi sincero, não escondeu o que estava, de fato, pensando sobre as coisas que estavam acontecendo.

Vladek, por outro lado, possuía uma personalidade, por vezes, intratável. Era mesquinho, sovina e racista (justo ele!). O autor, mais uma vez, não fez questão de omitir esse fato aos seus leitores, ou seja, não romantizou o protagonista. Por causa disso, a história tornou-se muito real, humana e próxima. No desenrolar das interações entre pai e filho era possível sentir as emoções e 'pensar o pensamento' (eu sei que isso ficou estranho) de todos os personagens: às vezes eu sentia raiva de Vladek, mas por outro lado, me sentia comovida; da mesma forma, ficava revoltada com o comportamento de Art, mas entendia que era muito complicado lidar com seu pai. É um livro que envolve demais, sem sombra de dúvidas.

O livro foi magistralmente construído e, por ser em quadrinhos, o texto ficou bem objetivo. Não foi preciso fantasiar, pois tudo o que tinha que ser dito e sentido estava lá. Tratar os diferentes grupos como diferentes animais foi uma sacada simplesmente sensacional: temos os judeus como ratos, os alemães como gatos (que apropriado!), os poloneses como porcos, os estadunidenses como cães, os franceses como sapos e os suecos como renas. Se todos tivessem sido retratados como humanos, de fato, o apelo não teria sido tão grande, não teria causado o mesmo impacto. Foi chocante sentir a fragilidade dos ratos diante dos gatos e até mesmo dos porcos. Os desenhos possuem uma qualidade extraordinária, transmitindo com maestria todas as sensações de angústia, dor, fome, tensão, frio, doença e, principalmente, impotência diante de tudo o que estava acontecendo.

É comovente!

Sobreviver naquelas condições era uma questão de sorte e, de certa forma, estratégia. Num determinado momento, o 'psi' (o autor se refere ao profissional desta forma) pergunta a Art se ele sente admiração por seu pai, por ele ter sobrevivido a Auschwitz; diante da resposta positiva, ele diz que sempre associamos o 'viver' à vitória, assim como associamos o 'morrer' à derrota, mas naquele contexto, viver ou morrer era aleatório. E, de fato, o relato demonstrou isso muito bem.

No meu entendimento, o autor estava escrevendo o livro mais para si mesmo do que para os outros. Prova disso é que Art se sentiu totalmente perdido quando a primeira parte da obra foi publicada e fez o maior sucesso. Todas as entrevistas e as propostas de negócio o deixaram 'pequenininho', como se tudo aquilo fosse demais para ele. Em uma de suas inúmeras declarações ele afirma que não queria provar nada a ninguém com aqueles quadrinhos. Talvez nem ele mesmo soubesse o que o levou a publicar a história de seu pai. Acredito que, para Art, entender exatamente como as coisas aconteceram e compreender todo o sofrimento pelo qual seus pais passaram fosse essencial para descobrir mais sobre si mesmo. Talvez seja esse o motivo de toda a sua ansiedade para obter os dados, muitas vezes 'passando por cima' dos sentimentos de seu pai.

Não posso deixar de parabenizar à Companhia das Letras pelo excelente trabalho na edição, diagramação e impressão do livro. Da capa à contracapa, é uma perfeição só. Cabe mencionar que este é o volume único, ou seja, a história completa (anteriormente, o livro havia sido publicado em duas partes). 

Recomendo demais a leitura!

Abraços e até a próxima!


Página do Memorial and Museum Auschwitz-Birkenau:
http://www.auschwitz.org/

Nenhum comentário:

Postar um comentário